Regime Simplificado de Importação: A ilegalidade da Portaria 156/99 do Ministério da Fazenda


No mundo globalizado as adaptações das empresas nacionais são cada vez mais necessárias. Em decorrência disso, também é necessária uma maior sofisticação nas políticas econômicas e fiscais, de modo a dar maiores condições para que a indústria nacional consiga melhorar sua produtividade e alcançar a eficácia. Em contrapartida, as empresas precisam investir em tecnologia e oferecer um produto competitivo ao mercado mundial, de modo em que não tenha uma total dependência de políticas protecionistas. Com a velocidade das informações, está praticamente inevitável a entrada de produtos estrangeiros no mercado doméstico.

Na última década temos visto um aumento considerável dos usuários do comércio exterior. Podemos ver isso nas redes sociais, grupos de importação, compartilhamentos e etc. As pessoas estão, cada vez mais, buscando o produto no exterior, seja por conta da inovação tecnológica, seja por conta do preço atrativo.

Entrando no mérito do nosso Sistema Tributário, temos um imposto bastante peculiar em relação aos demais: Imposto de Importação. Não entrarei no mérito das pessoas jurídicas, o foco do artigo será a tributação nas pessoas físicas.

Regime de Tributação Simplificado

Em 1980 foi instituído o Regime de Tributação Simplificado, para a cobrança do Imposto de Importação, incidente sobre os bens contidos em remessas postais internacionais, através do Decreto-Lei 1.804/88. O Decreto-Lei, que foi recepcionado pela Constituição Federal de 1.988 com status de lei, no sentido estrito, estabelece no seu Art. 2°, inciso II, que o Ministério da Fazenda poderá dispor sobre a isenção do imposto de importação dos bens contidos em remessas de valor até cem dólares norte-americanos, quando destinados a pessoas físicas.

Em 1999, através da Portaria 156, o Ministério da Fazenda estabeleceu requisitos para a aplicação do Regime de Tributação Simplificado, determinando que a isenção só seria aplicada aos bens que integrem remessa postal de até 50 dólares americanos, desde que o remetente e destinatários fossem pessoas físicas.

A Portaria em questão extrapolou o regime instituído no Decreto-Lei, o legislador deixou claro que o MF poderia estabelecer a isenção, desde que fosse nas condições apresentadas por ele.

Podemos ver uma violação no princípio da legalidade tributária, uma vez que uma norma complementar (Portaria Ministerial), trouxe uma situação nova em uma matéria prevista em lei e que deve obrigatoriamente ser matéria de lei (isenção), conforme o disposto no artigo 176 do Código Tributário Nacional (CTN).

Além disso, o artigo 111 do CTN determina que as isenções devem ser interpretadas literalmente. Portanto, o Ministério da Fazenda jamais poderia ter modificado os dispositivos do Decreto-Lei.

É muito comum a Receita Federal agir de forma arbitrária, cobrando altos impostos sobre o produto importado, desconsiderando seu valor aduaneiro, bem como a sua finalidade. Aparelhos eletrônicos, como smartphones, por exemplos, são geralmente tributados em valores superiores a R$ 250,00, ou até em valor superior, dependendo do Estado, onde incluem o ICMS, ainda que o valor aduaneiro tenha sido de até cem dólares americanos.

Os importadores, que se sentem prejudicados pela arbitrariedade do Ministério da Fazenda, podem reclamar judicialmente o valor pago para a retirada do objeto. Já existem várias decisões, inclusive colegiadas e orientações de TRU e TNU, favoráveis ao contribuinte. Para realizar o pedido de restituição, via judicial, não é necessário o acompanhamento de advogado, podendo ser feito diretamente na Justiça Federal da sua região.

Exemplos:

TRF 4ª Região

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE IMPORTACAO. ISENÇÃO. REMESSA POSTAL. PORTARIA Ministério da Fazenda Nº 156/99 e IN SRF 96/99. ILEGALIDADE. 1. Conforme disposto no Decreto-Lei nº 1.804/80, art. 2º, II, as remessas de até cem dólares, quando destinadas a pessoas físicas, são isentas do Imposto de Importacao. 2. A Portaria MF 156/99 e a IN 096/99, ao exigir que o remetente e o destinatário sejam pessoas físicas, restringiram o disposto no Decreto-Lei nº 1.804/80. 3. Não pode a autoridade administrativa, por intermédio de ato administrativo, ainda que normativo (portaria), extrapolar os limites claramente estabelecidos em lei, pois está vinculada ao princípio da legalidade.

(TRF-4 - APELREEX: 6870 RS 2005.71.00.006870-8, Relator: ÁLVARO EDUARDO JUNQUEIRA, Data de Julgamento: 14/04/2010, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: D.E. 04/05/2010)

Justiça Federal do Tocantins

No que diz respeito à isenção, ressai claro que os únicos requisitos eleitos pelo decreto- lei em análise foram que o bem importado tivesse valor igual ou inferior a cem dólares e se destinasse a pessoa física. É verdade que a isenção foi prevista como uma faculdade, cabendo ao Ministério da Fazenda a sua concretização ou não, como decorrência da utilização do verbo “poderá” no caput do artigo 2º . Todavia, uma vez feita a opção pela concessão da isenção, deve ser ela implementada em conformidade com os critérios fixados no inciso II do artigo 2º do decreto-lei em referência, em sua  literalidade, sendo eles unicamente o valor máximo de cem dólares por encomenda e a natureza de pessoa física do destinatário.

(TRF 1ª Região JFTO. Processo número 1877-83.2015.4.01.4300. Emitido pelo site em 13/06/2016 às 18:38:31)

Uniformização:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO JEF Nº 5018217-72.2015.4.04.7100/RS

Decreto-Lei 1.804/80: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/1965-1988/Del1804.htm

Portaria 156/99: http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/link.action?idAto=23977&visao=anotado

 

Autor: Samuel Lima
Contador formado pela Universidade Federal do Ceará
Docente do Ensino Superior
Consultor Tributário

Post atualizado em: 04/02/2020


Atualizado na data: 04/02/2020