Auxílio 2022 pode reduzir pobreza, mas conta para os mais pobres virá depois, alerta economista da FGV

O governo federal iniciou nesta semana o pagamento de uma série de benefícios sociais que pretende colocar dinheiro na mão das famílias mais pobres do país, além de um auxílio de R$ 1.000 para caminhoneiros e taxistas. Mas, na visão do diretor do FGV Social e fundador do Centro de Políticas Sociais (FGV Social/CPS), Marcelo Neri, essas medidas devem reduzir a pobreza apenas até o fim do ano, quando a maior parte das ações realizadas a partir da "PEC das bondades" diminui ou acaba.

"Esse pacote tem boas e más notícias. As boas vêm na frente. As más vêm depois. Quando o auxílio entra, a pobreza cai. Mas, quando ele sai, gera um aumento de pobreza maior que a redução inicial. Vimos isso em março de 2021, quando a pobreza subiu para 71,9 milhões de pessoas depois de ter caído para 42 com o auxílio emergencial", diz Neri, que foi ministro chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE) e presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) durante o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff.

Economista da FGV diz que novo "pacote de bondades do governo" tem boas e más notícias e as más virão a partir de 2023 — Foto: DIVULGAÇÃO/ FGV SOCIAL

Neri ganhou fama como um dos principais especialistas a identificar o fenômeno que ficou conhecido como ascensão da classe C.

Ele afirma, com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNADC), que a primeira edição do Auxílio Emergencial de R$ 600 reduziu a população com renda até R$ 497 em 23 milhões, entre março e agosto de 2020. Já a interrupção dele elevou a pobreza em 25 milhões de pessoas até janeiro de 2021. Para ele, o momento atual é de contenção, não de gastos.

"Agora, seria o momento de uma grande poupança, não crédito. O que houve no começo de 2021 talvez seja trailer do que aconteça em 2023", afirma Neri sobre a PEC, que terá custo de R$ 42,1 bilhões aos cofres públicos.

Em sua visão, essa injeção temporária de dinheiro no bolso dos brasileiros "é uma montanha russa ruim", que causa instabilidade e é ainda pior para os mais pobres. Ele diz que oferecer crédito consignado de maneira inédita para pessoas que recebem benefícios sociais é especialmente perigoso e faz uma analogia.

"Pegar crédito é comparável a andar de bicicleta. Você começa com duas rodinhas, depois uma. Mas o que o governo está falando hoje (oferecendo o consignado) é para o povo descer a ladeira sem rodinhas sem nunca ter andado antes", afirma Neri.

Para o economista da FGV, não há dúvidas de que o "pacote de bondades", como está sendo chamada a PEC, aquecerá a economia no fim do ano, que já é um período em que a população gasta mais por conta do 13º salário e trabalhos temporários.

Sua preocupação, no entanto, é como ficará a economia a partir de janeiro, sem todos esses estímulos e com parte da população mais pobre do país com um possível comprometimento do benefício social que recebe por conta do empréstimo consignado.

"A gente vai ver uma redução na pobreza no próximo mês, mas depois que houver a normalização no início do ano haverá um novo retrocesso. A pobreza e a insegurança alimentar estão altas, mas não é criando crédito consignado que se resolve o problema", diz Neri.

O economista diz que as medidas de injeção de dinheiro têm caráter político e ajudam a trazer boas notícias antes da eleição. Mas "a conta virá depois".

Primeiro, acontecerá uma queda nominal do benefício, de R$ 600 para R$ 400, agravada pela elevada inflação e acompanhada de um comprometimento da renda por conta do possível empréstimo consignado", explica.

Para ele, o governo deveria implantar um programa de distribuição de renda mais consistente, com um valor mais sustentável a longo prazo e que leve em conta o tamanho da família. Sem essa opção, o melhor, recomenda o especialista, é economizar para se preparar para o próximo ano.

"O que a gente deveria fazer é um esforço de poupança e conscientizar a população de que dias difíceis vêm pela frente e que é importante fazer um pé de meia. É importante gerar cautela na população para que ela possa suavizar seu padrão de consumo ao longo do tempo".

 

Fonte: G1

Data: 10/08/2022