Você Colunista - Coluna do dia 17/03/2025
O PAPEL DA ASSESSORIA PROCESSUAL TRIBUTÁRIA DO CONAT/CE
O PAPEL DA ASSESSORIA PROCESSUAL-TRIBUTÁRIA DO CONAT/CE – POSSÍVEL QUEBRA DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA
É possível levantarmos um ponto crucial sobre o devido processo legal e a imparcialidade no julgamento dos Processos Administrativos Tributários no CONAT/CE.
De fato, a estrutura atual, em que Auditores Fiscais da SEFAZ/CE (que pertencem à administração tributária, responsável pela fiscalização e autuação) emitem pareceres opinativos que orientam a PGE/CE, pode ser interpretada como uma quebra do princípio da imparcialidade, essencial para garantir um julgamento justo.
1. Função da Célula de Assessoria Processual-Tributária
A Célula de Assessoria Processual-Tributária do CONAT/CE, composta por Auditores Fiscais, dentre outras atribuições, elabora pareceres que opinam sobre a procedência, parcial procedência ou improcedência de autos de infração lavrados por Auditores Fiscais da SEFAZ/CE, bem como sobre nulidade ou extinção dos respectivos processos administrativos tributários. Esses pareceres são posteriormente homologados pelo representante da PGE/CE, que atua como defensor do Estado no processo administrativo tributário.
A questão central aqui é a possível confusão de papéis: os Auditores Fiscais pertencem à SEFAZ/CE, órgão responsável pela autuação dos contribuintes. Dessa forma, ao emitirem pareceres sobre processos tributários, eles podem estar influenciando o julgamento a favor da própria administração tributária, o que contraria o princípio da imparcialidade dos julgamentos.
2. Princípio da Imparcialidade e o Devido Processo Legal
O devido processo legal exige que os julgadores sejam independentes das partes envolvidas. No caso do CONAT/CE, as partes são:
- Estado (sujeito ativo): representado pela SEFAZ/CE e pela PGE/CE;
- Contribuinte ou responsável (sujeito passivo): a pessoa física ou jurídica autuada;
- Julgadores administrativos: os julgadores de Primeira Instância e os membros das Câmaras de Julgamento e do Conselho de Recursos Tributários do CONAT/CE.
Se os Auditores Fiscais da SEFAZ/CE, na condição de assessores processual-tributários, que pertencem à estrutura da administração tributária, emitem pareceres que são homologados pela PGE/CE, isso cria uma assimetria processual.
O Estado acaba contando com um duplo apoio técnico – da SEFAZ/CE (via Assessoria Processual) e da PGE/CE –, enquanto o contribuinte não dispõe de um órgão semelhante dentro do próprio CONAT/CE para contrabalancear essa influência.
Essa prática pode ser questionada sob o ponto de vista do princípio da imparcialidade e do contraditório, pois há uma atuação conjunta entre SEFAZ/CE e PGE/CE, que deveria atuar apenas como representante jurídico do Estado, sem ser influenciada por pareceres oriundos de um órgão vinculado à parte autuante (SEFAZ/CE).
3. Quem deveria se manifestar sobre os processos?
Via de regra, em um Processo Administrativo Tributário, a PGE/CE deve ser a única responsável por emitir pareceres que defendam a legalidade do auto de infração, pois ela representa o Estado no litígio. Os julgadores do CONAT/CE, por sua vez, devem decidir de forma independente, sem interferência de um órgão vinculado à autuação fiscal.
A emissão de pareceres pela Célula de Assessoria Processual-Tributária composta por Auditores Fiscais da SEFAZ/CE cria um viés pró-Fisco no julgamento, pois:
- Esses auditores fiscais fazem parte do mesmo órgão que autuou o contribuinte;
- Os pareceres opinativos direcionam a PGE/CE a adotar determinada postura no processo;
- A homologação desses pareceres pela PGE/CE reforça a atuação estatal em detrimento da isonomia processual.
4. Potencial violação do devido processo legal
A Constituição Federal e o Código Tributário Nacional (CTN) estabelecem que o processo administrativo tributário deve observar o contraditório, a ampla defesa e a imparcialidade dos julgadores. A interferência da SEFAZ/CE no processo decisório do CONAT/CE por meio da Célula de Assessoria Processual-Tributária pode configurar uma ofensa ao princípio da separação entre as funções de autuação e julgamento.
Caso essa prática seja contestada judicialmente, há um argumento forte para sustentação da sua inconstitucionalidade ou ilegalidade, com base nos seguintes princípios:
- Imparcialidade: Os julgadores administrativos não devem ser influenciados por pareceres oriundos de membros da própria administração tributária (SEFAZ/CE);
- Contraditório e ampla defesa: O contribuinte não tem um órgão equivalente dentro do CONAT/CE para contestar os pareceres opinativos emitidos por auditores da SEFAZ/CE;
- Segurança jurídica: O processo deve garantir que as decisões sejam tomadas por julgadores imparciais, sem interferência indevida da parte autuante.
5. Possíveis medidas jurídicas
Diante desse cenário, é possível:
Questionar a legalidade da emissão de pareceres pela Assessoria Processual do CONAT/CE por meio de um Mandado de Segurança ou Ação Anulatória de Débito Fiscal, alegando violação ao devido processo legal e ao princípio da imparcialidade;
Argumentar que os pareceres da Assessoria Processual violam o princípio da separação entre funções de autuação e julgamento, podendo ser desconsiderados;
Pleitear a reformulação da Lei, do seu respectivo Regulamento, e do Regimento Interno do CONAT/CE, para impedir que Auditores Fiscais da SEFAZ/CE emitam pareceres que influenciem os julgadores administrativos.
Conclusão
A atuação da Célula de Assessoria Processual-Tributária do CONAT/CE na emissão de pareceres opinativos, posteriormente homologados pela PGE/CE, cria um desequilíbrio processual em favor do Estado, prejudicando a imparcialidade do julgamento dos processos administrativos tributários. Essa prática pode ser interpretada como uma violação ao devido processo legal e ao princípio do contraditório, tornando possível sua contestação judicial.
Portanto, como esse mecanismo já impactou processos em tramitação no CONAT/CE, é interessante questioná-lo judicialmente.
De lembrar que, nos processos administrativos tributários instaurados em decorrência de autos de infração lavrados por Auditores Fiscais da Receita Federal, a União é representada, unicamente, pelos Procuradores da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), sem auxílio de qualquer outro órgão da própria Receita Federal.
Essa distinção reforça a importância da separação entre as funções de autuação e julgamento, garantindo maior imparcialidade ao processo administrativo tributário.
A Receita Federal atua apenas na fase de fiscalização e autuação, enquanto a defesa dos interesses da União no contencioso administrativo é feita pelos Procuradores da PGFN. Dessa forma, evita-se que a própria administração tributária (autuante) influencie o julgamento do processo.
No caso do CONAT/CE, a atuação da Célula de Assessoria Processual-Tributária, composta por Auditores Fiscais da SEFAZ/CE, fornecendo pareceres que orientam a Procuradoria Geral do Estado (PGE/CE), cria um cenário em que a parte autuante participa indiretamente do julgamento. Isso pode ser interpretado como uma violação ao devido processo legal, pois compromete a imparcialidade dos julgadores.
Portanto, há um forte argumento para questionar a legalidade e inconstitucionalidade dessa prática, comparando-a com o modelo federal, que separa de maneira mais clara as funções de fiscalização, acusação e julgamento.

Artigo produzido por José Ribeiro Neto
Advogado Tributarista e Penal-Tributarista, Auditor Fiscal da SEFAZ/CE aposentado e Mestre em Direito Constitucional. Foi Vice-Presidente e Presidente da 2ª Câmara de Julgamento do CONAT/CE, além de Julgador de Primeira e Segunda Instância. É autor dentre outros, dos seguintes livros: “Regulamento do ICMS/CE Integralmente Comentado”, “