Você Colunista - Coluna do dia 14/10/2024



O Futuro da Tributação com o Uso de Tecnologia


Introdução

A administração tributária está sendo transformada globalmente com o uso de Big Data, Inteligência Artificial (IA) e Blockchain, tornando a arrecadação e as fiscalizações mais eficientes, transparentes e seguras. A implementação dessas tecnologias redefine o relacionamento entre o Fisco e os contribuintes, promovendo maior eficiência e redução de custos operacionais, além de permitir auditorias em massa mais precisas.

ICMS e Reforma Tributária: Desafios e Oportunidades

A Reforma Tributária brasileira propõe unificar tributos como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Programa de Integração Social (PIS), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) (Agência Senado, 2023a). Essas mudanças visam simplificar o sistema tributário, e o uso de tecnologias, como o Big Data, é crucial para monitorar a transição e avaliar seus impactos.

Apesar dessas mudanças, as administrações fiscais continuam avançando na otimização de processos e na detecção de infrações fiscais. Tecnologias inovadoras estão sendo usadas para aumentar a eficiência da fiscalização e garantir o cumprimento das obrigações tributárias. A automação e o uso de grandes volumes de dados são ferramentas essenciais para identificar irregularidades e melhorar a gestão fiscal (Almada, 2024).

Exemplo no Ceará: A Secretaria da Fazenda do Estado do Ceará (Sefaz/CE) tem sido uma das pioneiras no uso de tecnologias para otimizar a fiscalização e monitoramento do ICMS. Durante o 76º Encontro Nacional de Coordenadores e Administradores Tributários Estaduais (ENCAT), o Estado destacou a utilização da Declaração de Informações de Meios de Pagamento (DIMP), uma ferramenta que aprimora o controle sobre transações financeiras e amplia a eficiência fiscal (Associação Nacional das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais, 2024). Além disso, a Instrução Normativa nº 24, de 7 de março de 2023 (Sefaz/CE, 2023), reforça o uso da DIMP e dos próprios dados dos documentos fiscais eletrônicos para monitorar as empresas do Simples Nacional conforme definido pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006 (Brasil, 2006).

A DIMP coleta dados sobre transações realizadas por meio de cartões de crédito, débito, PIX e outros meios de pagamento eletrônicos (Sefaz/MT, 2023). Ela desempenha um papel importante na identificação de fraudes e evasão fiscal, proporcionando maior controle e transparência sobre as operações financeiras dos contribuintes. Regulamentada pelo Ato Cotepe/ICMS nº 65/18 (Confaz, 2018) e pelo Convênio ICMS 134/16 (Confaz, 2016), a DIMP é uma ferramenta essencial para o monitoramento fiscal, principalmente em operações sujeitas ao ICMS.

Exemplo Nacional: A Receita Federal implementou o Sistema Público de Escrituração Digital (SPED), uma plataforma que centraliza informações fiscais de empresas, permitindo a integração e o cruzamento de dados de tributos como PIS e Cofins. O SPED utiliza Big Data para cruzar informações bancárias e fiscais, permitindo que irregularidades sejam identificadas com rapidez (Franco, 2024).

Exemplo Internacional: A Estônia, conhecida por seu sistema tributário totalmente digitalizado, utiliza Blockchain para garantir a segurança e a imutabilidade das transações fiscais. Essa tecnologia permite auditorias em tempo real, promovendo maior transparência e eficiência na administração pública (Brasil, 2020).

A simplificação tributária, aliada ao uso de tecnologias digitais, poderá reduzir a burocracia e os custos operacionais das empresas (Brasil, 2023b).

Fiscalização Inteligente: O Papel da IA e Ciência de Dados

A fiscalização inteligente envolve o uso de IA e Ciência de Dados para detectar fraudes e melhorar a eficiência das auditorias fiscais.

Exemplo no Ceará: O Projeto Suggeri, foi premiado nacionalmente. O sistema utiliza IA para recomendar ações fiscais, potencializando a eficiência das auditorias. A Sefaz/CE também utiliza Big Data para monitorar o Controle Fiscal de Preços (Cofip) e prevenir fraudes fiscais (Sefaz/CE, 2021).

Exemplo Nacional: A Receita Federal implementou o Projeto Harpia, um sistema baseado em IA que cruza dados fiscais, bancários e de comércio exterior, permitindo auditorias mais ágeis e eficientes. Esse sistema foca em grandes contribuintes com alto risco de sonegação fiscal (Serpro, 2008).

Exemplo Internacional: O Reino Unido, através do Making Tax Digital (MTD), utiliza IA para monitorar declarações fiscais em tempo real. Esse sistema melhora a conformidade tributária e reduz o erro humano nas declarações (Edicom, 2020). Segundo a OECD (2023), o uso de IA e Big Data nas administrações fiscais tem aumentado a precisão e reduzido o custo das auditorias.

Processo Administrativo Tributário: O Impacto da Digitalização

A digitalização dos processos administrativos tem facilitado significativamente a resolução de disputas fiscais, além de melhorar a gestão documental, tornando o acompanhamento mais ágil e eficiente.

Exemplo no Ceará: A Sefaz/CE tem digitalizado seus processos, permitindo que os contribuintes acompanhem o andamento dos processos de maneira virtual. O uso de plataformas digitais aumenta a transparência e a eficiência na resolução de contenciosos (Mourão, 2021).

Exemplo Internacional: O Internal Revenue Service (IRS) dos Estados Unidos implementou um sistema de atendimento digital, permitindo que contribuintes resolvam disputas de maneira ágil e eficiente. A digitalização também melhorou a gestão de grandes volumes de documentos fiscais (Conformidade [...], 2024).

A digitalização dos processos administrativos não apenas aumenta a eficiência, mas também traz mais transparência e confiabilidade ao sistema fiscal (Romão, 2024).

Crimes Fiscais: Prevenção e Segurança na Era Digital

As novas tecnologias desempenham um papel essencial na prevenção de crimes fiscais, oferecendo maior segurança e controle sobre as transações financeiras.

Exemplo no Ceará: A Sefaz/CE, assim como outras unidades da federação, utiliza bases de dados de documentos eletrônicos e movimentações financeiras para garantir a integridade e segurança das transações fiscais. Esse sistema ajuda a detectar atividades irregulares, promovendo maior conformidade e evitando fraudes (Almada, 2023).

Exemplo Nacional: A plataforma de Notas Fiscais Eletrônicas (NF-e), administrada pela Receita Federal, permite o cruzamento de dados de operações entre Estados, identificando rapidamente fraudes e sonegação fiscal, especialmente em setores vulneráveis (Oliveira, 2024).

As tecnologias de IA e Blockchain têm o potencial de transformar radicalmente a fiscalização fiscal. A IA permite uma análise mais rápida e precisa de grandes volumes de dados, enquanto o Blockchain garante a segurança e a imutabilidade das transações, prevenindo fraudes de forma mais eficiente (Almada, 2024).

Considerações Finais

A tecnologia está transformando a administração tributária no Brasil e no mundo. O exemplo do Estado do Ceará e da Receita Federal do Brasil segue as melhores práticas internacionais, destacando o uso de Big Data, IA e Blockchain, modernizando a fiscalização tributária e melhorando a conformidade fiscal.

A Reforma Tributária traz desafios, mas também oferece oportunidades de modernização. Nesse sentido, é essencial que governos, contribuintes e profissionais adotem essas novas tecnologias para garantir uma administração fiscal mais eficiente, segura e transparente.

Referências

AGÊNCIA SENADO. Reforma tributária promulgada: principais mudanças dependem de novas leis. Agência Senado, Brasília, DF, 21 dez. 2023a. Disponível em: https:// www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/12/21/reforma-tributaria-promulgadaprincipais-mudancas dependem-de-novas-leis. Acesso em: 10 out. 2024.

AGÊNCIA SENADO. Simplificação de obrigações tributárias para empresas vai a sanção. Agência Senado, Brasília, DF, 5 jul. 2023b. Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2023/07/05/simplificacao-deobrigacoes-tributarias-para empresas-vai-a-sancao. Acesso em: 10 out. 2024.

ALMADA, Paulo Sergio Coutinho de. Modernização da fiscalização: a revolução da inteligência fiscal com IA e Big Data. Migalhas, [Ribeirão Preto], 11 out. 2024. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/417201/revolucao-fiscal-ia-ebig-data-na-modernizacao-da-fiscalizacao. Acesso em: 11 out. 2024.

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DAS ASSOCIAÇÕES DE FISCAIS DE TRIBUTOS ESTADUAIS. No 76º ENCAT, Rodrigo Spada defende atribuições e prerrogativas da Administração Tributária. Febrafite, Brasília, DF, 26 set. 2024, Disponível em: https://www.febrafite.org.br/no_76o_encat_rodrigo_defende_atribuicoes_e_prerrogati vas_do_fisco/. Acesso em: 10 out. 2024.

BRASIL. Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006. Institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte; altera dispositivos das Leis nº 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, da Lei nº 10.189, de 14 de fevereiro de 2001, da Lei Complementar nº 63, de 11 de janeiro de 1990; e revoga as Leis nº 9.317, de 5 de dezembro de 1996, e 9.841, de 5 de outubro de 1999. Brasília, DF: Presidência da República, [2021]. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm. Acesso em: 10 out. 2024.

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CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA FAZENDÁRIA (Brasil). Ato Cotepe/ICMS nº 65, de 19 de dezembro de 2018. Dispõe sobre as especificações técnicas para a geração de arquivos referentes às informações prestadas por instituições financeiras e de pagamento, integrantes ou não do Sistema de Pagamentos Brasileiro – SPB, relativas às transações com cartões de débito, crédito, de loja (private label) e demais instrumentos de pagamento eletrônico, realizadas por pessoas jurídicas inscritas no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ ou pessoas físicas inscritas no Cadastro de Pessoa Física – CPF, ainda que não inscritas no cadastro de contribuintes do ICMS, nos termos do Convênio ICMS 134/16. Brasília, DF: Confaz, [2023]. Disponível em: https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/atos/2018/ato-cotepe-icms-65-18. Acesso em: 11 out. 2024.

CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA FAZENDÁRIA (Brasil). Convênio ICMS 134, de 9 de dezembro de 2016. Dispõe sobre o fornecimento de informações prestadas por instituições e intermediadores financeiros e de pagamento, integrantes ou não do Sistema de Pagamentos Brasileiro – SPB, relativas às transações com cartões de débito, crédito, de loja (private label), transferência de recursos, transações eletrônicas do Sistema de Pagamento Instantâneo e demais instrumentos de pagamento eletrônicos, bem como sobre o fornecimento de informações prestadas por intermediadores de serviços e de negócios referentes às transações comerciais ou de prestação de serviços intermediadas, realizadas por pessoas jurídicas inscritas no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ ou pessoas físicas inscritas no Cadastro de Pessoa Física – CPF, ainda que não inscritas no cadastro de contribuintes do ICMS. Brasília, DF: Confaz, [2024]. Disponível em: https://www.confaz.fazenda.gov.br/legislacao/convenios/2016/CV134_16. Acesso em: 11 out. 2024.

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Artigo produzido por Paulo Almada


Pós-doutor em Docência e Investigação, Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, Mestre em Direito e Gestão de Conflitos, Especialista em Administração Fazendária e em Direito Processual, Bacharel em Direito e em Ciências Contábeis. Possui treinamento em Mediação pela Columbia University of New York. Servidor Público da Sefaz/CE e autor de vários livros sobre ICMS.

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