Empresas reduzem compras de insumos do exterior e defendem imposto menor para produzir no País
Quando instalou a célula produtiva nos EUA, o custo de produção era 30% inferior ao do Brasil. Hoje, está cerca de 40% acima, afirma Rodolfo Garcia, diretor-geral e fundador da Thermoval. O cálculo leva em conta a alta do dólar e dos salários dos empregados locais, assim como os custos com transporte das peças para o Brasil.
"Vamos comprar mais equipamentos aqui, gerar empregos e ainda assim enfrentamos uma burocracia para trazer as máquinas para cá, que só vão chegar em outubro", diz o executivo.
No ano passado, quando respiradores estavam em falta no País logo após a chegada da pandemia, a Thermoval desenvolveu e produziu válvulas proporcionais (que aumentam ou diminuem a vazão de ar eletronicamente) para o equipamento fabricado por outras empresas.
A Leroy Merlin, rede varejista de materiais de construção com 45 lojas no País, tem 15% de seu faturamento, previsto em R$ 8 bilhões este ano, com produtos importados diretamente de diversos países ou por meio de seus fornecedores. A ideia é que essa fatia caia para 5% a 7% em quatro anos, diz Ignacio Sánchez, presidente do grupo.
Além de ter de lidar menos com atrasos de navios e com a inflação de preços provocada pelo falta global de produtos e matérias-primas, a localização de itens vendidos pela rede traz tecnologia e gera empregos no País, afirma Sánchez.
"O Brasil deveria aproveitar este momento para simplificar os impostos, favorecer os investimentos e produzir tudo o que for possível, de produtos têxteis até móveis de banheiro, de jardins e pisos laminados", afirma o executivo. Ele defende incentivos para a nacionalização por meio de redução de impostos de máquinas e equipamentos para a produção.
Acordos feitos com fornecedores que importam produtos revendidos à rede levaram vários deles a produzir itens no País. Cerâmicas que vinham da Itália, Espanha, Turquia e China agora são 100% adquiridas localmente pela Leroy e a parcela de pisos laminados nacionais cresceu.
Produção local desenvolve toda a cadeia produtiva
A pandemia também levou a Basf a intensificar seu programa de nacionalização, que já estava em andamento há vários anos. A vice-presidente de Care Chemicals para a América do Sul, Priscila Camara, afirma que 15 produtos foram nacionalizados desde março do ano passado com tecnologias trazidas da Alemanha e dos Estados Unidos.
Um desses produtos é o espessante para a produção de álcool em gel. "Em 20 dias passamos a produzir centenas de toneladas do produto na fábrica de Guaratinguetá (SP) e pudemos abastecer o mercado nacional com o insumo que estava em falta no ano passado", diz ela.
Outro exemplo é o início de fabricação, na unidade de Jacareí (SP), de um aditivo para adjuvante para o mercado da agroindústria, que tem origem vegetal, em substituição ao de origem mineral. Segundo Priscila, oito meses depois do início da fabricação, no fim do ano passado, a empresa conseguiu a aprovação da matriz para duplicar a capacidade produtiva do produto.
"Com a produção local conseguimos vencer obstáculos que são comuns na importação de produtos químicos como a maior complexidade da logística, a pouca flexibilidade quanto aos volumes adquiridos e prazos menos previsíveis", afirma Priscila.
Outra vantagem, reforça ela, é que a produção local desenvolve toda a cadeia produtiva, promovendo seu adensamento, e traz inúmeros impactos positivos como investimos em inovação, compra de matéria-prima no Brasil e geração de empregos.
Há 29 anos operando apenas como importadora de óleos para motores e lubrificantes para veículos, a Motul, com escritório em São Paulo, passou a receber os produtos da matriz francesa com atrasos de 60 a 90 dias em razão da falta de insumos químicos para a produção e da indisponibilidade de contêineres e navios para o transporte.
O grupo decidiu então iniciar a fabricação de alguns itens, e começou com lubrificantes para motos de baixa cilindrada. Guillaume Pailleret, CEO da Motul Brasil, conta que nesta primeira etapa a opção foi por terceirizar a produção, mas a ideia é ter fábrica própria em dois anos e expandir a linha de produtos.
"Com a produção local economizamos apenas 10% em relação ao custo de importação, mas nosso objetivo era não ficar dependente do transporte internacional e poder atender nossos clientes", diz Pailleret.
Às voltas com a falta de semicondutores que tem levado várias fábricas a suspenderem a produção, a indústria automobilística participa de um grupo coordenado pela Secretaria Especial de Produção Industrial e Comércio Exterior do Ministério da Economia - chamado de "made in Brasil" -, que tem também representantes do setor de autopeças e de entidades sindicais.
Henry Joseph Junior, diretor técnico da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), afirma que um dos candidatos à nacionalização é a transmissão automática. O item já está em mais da metade dos carros novos vendidos no País, mas não tem produção local.
Também está na mira do setor itens relativos à tecnologia embarcada, principalmente os de controle eletrônico. Segundo Joseph, o Brasil é fortemente dependente de importação desses componentes.
Menos volatilidade cambial
No início do ano, a Bosch anunciou a transferência de uma linha de produção de sistemas injetores a diesel dos Estados Unidos para sua unidade de Curitiba (PR), onde mantém um centro de desenvolvimento de plataforma desses sistemas voltados à exportação.
A NGK, fabricante de velas de ignição, teve o processo de nacionalização de velas especiais antecipado pela pandemia, que dificultou as importações. A peça é feita com materiais nobres e vinha da matriz japonesa, que continuará fornecendo insumos para a produção local.
Segundo José Eduardo de Souza, chefe de assistência técnica no Brasil, uma das vantagens é reduzir a exposição do produto à volatilidade cambial.
Fonte: Terra