Com novo presidente, contribuintes temem guinada fiscalista no Carf

A indicação do auditor fiscal Carlos Higino Ribeiro de Alencar para a presidência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) causou, nos contribuintes, o temor de uma possível guinada fiscalista no órgão.

A nomeação de Higino, auditor fiscal desde 1997, vai na direção de um perfil mais fiscalista em contraposição ao atual presidente, Carlos Henrique de Oliveira, que teve a gestão marcada por uma maior interlocução com o setor privado e uma maior independência em seus posicionamentos durante os julgamentos.

 A primeira avaliação foi de um perfil técnico, político e com um “ótimo” currículo, mas a falta de experiência no Carf chamou a atenção. Alguns dos julgadores consideraram “estranha” a indicação de alguém de fora do órgão.

O indicado é graduado em economia pela Universidade de São Paulo (1994) e em direito pela Universidade Federal do Ceará (2003). É mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa – IDP (2009) e doutor em direito pelo Centro Universitário de Brasília (2022), em cotutela com a Universidade de Paris 1 – Pantheón Sorbonne, na França.

Na Receita Federal, Higino atuou como diretor, coordenador-geral e chefe de divisão, além de representar a Receita Federal como membro titular do Comitê de Monitoramento e Avaliação de Subsídios da União (CMAS).

Fora da Receita, foi ministro interino e secretário-executivo da Controladoria-Geral da União (CGU), secretário de estado de Transparência e Controle do Distrito Federal e secretário-executivo da Comissão de Ética Pública da Presidência da República (CEP). Ele atuou ainda como presidente do Conselho Fiscal do Serpro e da Corretora do Banco Regional de Brasília (BRB).

A mudança no comando do Carf vinha sido aventada, entre outros motivos, por conta da nomeação para secretário especial da Receita Federal do ex-procurador do município de São Paulo, Robinson Barreirinhas, e da ex-presidente do Carf, Adriana Rêgo, para secretária especial adjunta da Receita. Além disso, era esperado que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), optasse por um nome mais fiscalista no conselho administrativo.

Oliveira era considerado próximo do secretário da Receita do governo anterior, Júlio César Vieira Gomes. Em carta enviada ao vice-presidente Geraldo Alckmin em dezembro do ano passado, um conjunto de entidades empresariais chegou a defender a permanência de Oliveira no posto, argumentando que ele agradou tanto os representantes do fisco quanto dos contribuintes e atuou para reduzir o estoque de processos.

‘Veio para arrecadar’

 Parte do plano da Fazenda para diminuir o déficit fiscal seria criar uma transação tributária para os casos no Carf.

Advogados que atuam no conselho também expressaram a preocupação com uma possível guinada fiscalista no Carf. Entre os temores elencados está o fato de Higino não ter proximidade com o tribunal. “Do ponto de vista técnico ele é muito preparado, mas nunca esteve no Carf. Eis o nosso medo”, disse um tributarista.

Outras fontes viram a mudança como positiva porque, segundo elas, o presidente do Carf precisa estar conectado com o Ministério da Fazenda. Desta forma, seria natural que um novo ministro coloque na posição alguém de perfil técnico e alinhado às posições do novo governo.

O presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco Nacional), Mauro Silva, elogiou o currículo do indicado e ressaltou que a escolha de um auditor “segue o curso natural das coisas”. “O currículo dele é de alguém preparado. Então é auditor, tem um bom currículo, não temos nada a dizer, só desejar a ele que faça um excelente trabalho”, afirmou.

Mudança de jurisprudência

A saída de Carlos Henrique de Oliveira do cargo foi lamentada por alguns conselheiros que o consideravam muito bom tecnicamente, um ótimo gestor e de bom trato com seus pares. Oliveira assumiu a presidência em maio de 2022 no lugar de Adriana Rêgo.

No cargo, ele retomou as sessões em todas as turmas, que estavam paralisadas pelo movimento dos auditores fiscais no ano passado. Oliveira presidiu duas sessões em São Paulo, em setembro e em dezembro. A justificativa foi de economia nos gastos com passagens e hospedagens, já que muitos conselheiros e advogados moram na capital paulista. Ainda não está claro se essa alteração será mantida pela nova gestão.

Oliveira também inovou ao participar de todas as sessões das turmas da Câmara Superior ao lado da conselheira Ana Cecília Lustosa, vice-presidente do Carf. A participação de ambos levou a alterações de jurisprudência, inclusive com a reversão de entendimentos de forma favorável aos contribuintes.

Em pelo menos dois casos, a posição de Carlos Henrique Oliveira foi definidora para a alteração de entendimentos. No processo 18108.002455/2007-10, julgado em novembro, o Carf afastou, por seis votos a quatro, a tributação sobre bolsas de estudos para dependentes de empregados em um julgamento em que Oliveira abriu a divergência.

Já em julho de 2022, o Carf afastou a trava de 30% para aproveitamento de prejuízo fiscal e base negativa de CSLL no momento de extinção da empresa pela primeira vez por maioria. A decisão favorável ao contribuinte no processo 19515.005446/2009-03 teve voto decisivo de Carlos Henrique Oliveira para formar o placar de cinco votos a três.


Fonte: JOTA PRO TRIBUTOS

Data: 06/01/2023