STJ mantém cobrança de taxa por portos

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem mantendo decisões de segunda instância favoráveis à tarifa pelo Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres (SSE) - também chamada de THC 2.

A discussão, de bilhões de reais, opõe empresas do setor de portos há duas décadas.

Um desses casos foi julgado nesta semana. O resultado beneficiou a empresa Santos Brasil. Outro, em setembro do ano passado, favoreceu o Grupo Libra. Ambos os julgamentos ocorreram na 1ª Turma.

As operadoras de terminais portuários cobram a tarifa das operadoras de terminais retroportuários, os “portos secos” - estações aduaneiras em zonas secundárias que também realizam desembaraço, armazenamento e despacho da carga.

Quando o importador opta por usar o porto seco, o terminal portuário que recebe os navios cobra a tarifa das empresas que administram os terminais retroportuários. O serviço consiste em retirar o contêiner da pilha de armazenamento do seu pátio e movimentá-lo até o portão, para que possa ser transferido.

Existe discussão em torno dessa cobrança desde que foi instituída. Empresas que administram os portos secos são contra. Sustentam que os usuários dos portos já pagam uma taxa, a THC, ao dono do navio para fazer a retirada da carga dos terminais. A cobrança “extra” pelo terminal portuário geraria desvantagem concorrencial.

É que se o importador faz o desembaraço aduaneiro no próprio terminal portuário, onde os navios atracam e entregam as cargas, essa cobrança não existe.

As operadoras dos terminais portuários, que cobram a THC 2 dos portos secos, afirmam, por outro lado, que têm custos com esse procedimento. A THC, prevista nos contratos com os donos dos navios, abrange a retirada da mercadoria do navio até a colocação do contêiner na pilha armazenada no terminal. A partir desse momento não haveria mais cobertura - por isso a THC 2.

Sem esse serviço, dizem, haveria um caos logístico. Os terminais retroportuários teriam que disponibilizar caminhões para a retirada das cargas dos navios, o que provocaria quilômetros de congestionamento e demora na transferência.

Os casos que chegaram ao STJ são antigos. A Santos Brasil e o Grupo Libra recorreram à Justiça em 2005 contra decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que impedia a cobrança. Na ocasião, o órgão interpretou que a tarifa causava danos concorrenciais.

As empresas conseguiram derrubar a decisão do Cade na Justiça. A ação do Grupo Libra foi julgada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), com sede no Distrito Federal. A ajuizada pela Santos Brasil, pelo TRF-3, em São Paulo.

Os desembargadores consideraram que a THC 2 não gera prejuízo à livre concorrência. O acórdão de São Paulo destaca que não houve empecilho ao acesso de novas empresas ao mercado ou qualquer dificuldade de funcionamento e desenvolvimento de empresas concorrentes. Cita ter havido, inclusive, aumento do número de recintos alfandegários desde a privatização dos portos.

Os dois processos subiram para o STJ por meio de recursos protocolados pelo Cade. A Marimex, operadora retroportuária, atuou no caso envolvendo a Santos Brasil - como assistente e também “recorrente”.

“A cobrança da THC 2 causa aumento do custo Brasil. Um prejuízo da ordem de R$ 700 milhões ao ano, podendo esse valor chegar a R$ 1 bilhão ao ano”, disse aos ministros, durante o julgamento, o advogado Bruno Burini, que representa a Marimex.

Representantes do Cade não fizeram sustentação oral nesse julgamento e a ausência foi destacada pela advogada, na sua fala aos ministros. “O Cade não está aqui porque mudou de posição. Evoluiu”, disse, frisando que a decisão em análise havia sido proferida há quase duas décadas.

A advogada se referiu a um acordo firmado em 2021 entre o Cade e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), que regula o setor e tem posição favorável à cobrança.

Representantes dos dois órgãos assinaram um memorando. Consideraram que a cobrança não configura, por si só, um ato ilícito. Mas reconheceram que podem existir situações em que ela se revele abusiva e, nesses casos - identificada a irregularidade - serão tomadas medidas conjuntas.

O Valor procurou o Cade para falar sobre os julgamentos no STJ, mas não teve retorno até o fechamento da edição.

Os ministros da 1ª Turma não entraram na discussão de mérito, sobre a validade da THC 2. Eles rejeitaram os recursos contra as decisões de segunda instância por questões processuais. Consideraram que implicaria reexame de provas, o que é vedado na Corte.

O relator dos dois casos é o ministro Sérgio Kukina e a decisão, em ambos, foi unânime (REsp 1537395 e REsp 1774301).

Esse posicionamento do STJ, no entanto, não põe fim às discussões em torno da THC 2. Um processo sobre o tema está em tramitação no Tribunal de Contas da União (TCU).

O TCU proibiu a cobrança em sessão plenária realizada em junho do ano passado. A decisão foi tomada durante análise de denúncias sobre possíveis irregularidades no processo de revisão da Resolução nº 72, da Antaq, que autoriza a THC 2 e fixa parâmetros para a sua aplicação.

Os ministros do determinaram a anulação de todos os dispositivos da norma que tratam da tarifa. Eles concordaram com as alegações dos denunciantes - que tiveram identidade mantida sob sigilo - de ausência de realização de Análise Prévia de Impacto Regulatório (AIR), antes de a Antaq elaborar a minuta da resolução levada a audiência pública, e de ilegalidades na criação da THC 2.

Os julgadores consideraram a cobrança ilegal, especialmente, pela possibilidade de os terminais portuários aumentarem os custos das empresas que administram os portos secos. “O recinto seco é concorrente direto do recinto molhado”, diz a decisão (Acórdão 1.448/2022).

As operadoras dos terminais portuários recorreram ao STF por meio de um mandado de segurança coletivo da Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres (Abratec). Mas desistiram do caso depois de a Antaq apresentar recurso ao próprio TCU. Esse processo ainda não teve uma decisão definitiva.

 

Fonte: Correa e Lopes Consultoria

Data: 17/04/2023