Fim de isenção fiscal para setor de eventos pode subir preços no Ceará; setores alegam impactos nas operações

Após ser prorrogado, o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) será encerrado oficialmente neste mê após atingir o teto de R$ 15 bilhões em isenções fiscais.
O fim do programa é reprovado pelos setores de turismo e eventos do Ceará, que alegam riscos de fechamento de estabelecimentos. Especialistas apontam que o preço final dos produtos e serviços pode subir com a volta das tributações.
O Perse foi criado em 2021, após o auge da pandemia de Covid-19, como forma de apoiar financeiramente os setores atingidos pelo isolamento social. O programa zerou o imposto incidente sobre as receitas e os resultados das atividades relativas ao setor de eventos.
Na prática, as empresas deixavam de pagar PIS, Cofins, Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Os benefícios deveriam ser encerrados em 2024, mas o Congresso Nacional aprovou a prorrogação com algumas mudanças. Os setores beneficiados pela isenção de tributos federais passaram de 44 para 30.
Também foi definido que o programa chegaria ao fim em dezembro de 2026, com um teto de isenções de R$ 15 bilhões. Como o limite de isenções foi atingido em março, conforme divulgado pela Receita Federal, o fim foi adiantado.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que haverá auditoria para confirmar se o teto do benefício foi atingido, e que não há possibilidade de retomada das isenções.
VOLTA DA COBRANÇA JÁ ERA ESPERADA
A volta da cobrança já era esperada devido às regras aprovadas ano passado e porque o programa surgiu em um período emergencial, avalia Patrícia Alves, conselheira do Conselho Regional de Contabilidade do Ceará (CRC). A surpresa deve ser amarga para as empresas que não estavam acompanhando o cenário.
A especialista explica que a carga bruta dos quatro impostos pode variar de 6% a 33% sobre o valor do serviço ou produto ofertado, a depender do modelo de tributação. Com a volta da cobrança dos tributos, uma das medidas dos empresários pode ser subir os preços para o consumidor final.
“As empresas conseguiram economizar, oferecer um bom preço. Agora com a volta dos impostos, podem voltar aos preços mais altos. Alguns na realidade estavam se beneficiado do programa para gerar mais lucro e, se não aumentarem o preço, podem perder essa margem de lucro”, aponta. As empresas beneficiárias que utilizaram da isenção fiscal para recompor o caixa e crescer o lucro devem fazer um novo planejamento tributário, se readequando ao pagamento dos tributos.
“Tem que olhar para dentro e ver como podem tentar recuperar a margem, cientes do risco de perder clientes se aumentar o preço, porque há clientes sensíveis à mudança de preço. Esse vai ser o reflexo para os que não estavam acompanhando e não tinham um plano B”, comenta.
SETOR HOTELEIRO TEME IMPACTO
São beneficiados pelo Perse restaurantes, bares, agências de viagem, operadores turísticos, parques de diversão, organizações ligadas à cultura e à arte e atividades de jardins, zoológicos, reservas e parques nacionais. O benefício não se aplica às empresas optantes do Simples Nacional.
Ivana Bezerra, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis do Ceará (ABIH-CE), aponta que o fim do programa pode ser prejudicial para diversas empresas do setor, que se programavam para receber a isenção fiscal até 2026.
“O Perse foi a salvação para muitas empresas do setor do turismo e eventos. Muitas empresas fizeram renegociação com o próprio Governo Federal para que conseguissem entrar no Perse. Não sabemos como muitas empresas vão ficar, é muito preocupante”, afirma.
A presidente não soube informar quantas empresas podem ser impactadas negativamente com o fim do programa, mas ressaltou que o Perse é 'essencial para grandes e pequenos estabelecimentos, sem exceção'.
A ABIH chama atenção para a necessidade de averiguar se as empresas que utilizaram os benefícios são realmente dos setores autorizados.
O Sindicato das Empresas Organizadoras de Eventos e Afins do Estado do Ceará (Sindieventos) também demonstrou preocupação com os impactos do fim do programa emergencial.
A reoneração fiscal pode comprometer a recuperação financeira das empresas, levando a possíveis demissões e redução de investimentos em projetos culturais e empresariais"
Eldair Melo, mestre em Economia e membro do Conselho Regional de Economia Ceará (Corecon-CE), avalia que os impactos devem ser sentidos principalmente pelas pequenas empresas.
Com a alta nos custos, o Estado pode registrar diminuição da oferta de eventos e redução no ritmo de eventos. “O turismo, que é um dos pilares da economia cearense, pode sentir uma desaceleração, pois eventos e congressos são grandes impulsionadores do setor”, avalia o economista.
Há ainda possibilidade de um 'efeito dominó', com aumento dos preços dos ingressos e redução de vagas de emprego. O especialista ressalta que a mudança exige revisão de custos e criação de novas fontes de receita.
“É importante construir uma reserva de emergência para enfrentar períodos de menor demanda e instabilidades no setor. Caso seja necessário captar recursos, optar por linhas de financiamento com juros baixos e utilizar o crédito estrategicamente”, afirma.
SETOR DE BARES E RESTAURANTES MINIMIZA PERDAS
Já a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes do Ceará (Abrasel) identifica que o fim do programa deve ter impactos significativo, mas não deve resultar em alta nos preços.
Taiene Righetto, presidente da Abrasel no Ceará, aponta que cerca de 90% dos bares e restaurantes estão inseridos no regime do Simples Nacional e não podem se beneficiar pelo Perse.
“Só existe risco de impacto para cerca de 10%, os restaurantes maiores, que a maioria tem dívidas de impostos que estavam começando a ser pagas com o Perse. Então muito provavelmente vão se endividar novamente e podem ter que fechar as portas”, afirma.
A Abrasel defende a manutenção do programa pelo período originalmente previsto, para a continuidade da 'recuperação completa do setor', e reconhece os avanços obtidos com os incentivos fiscais.
Taiene ressalta que o setor já se desenvolveu acima do patamar anterior à pandemia. “Nós tivemos 55% de falência na pandemia de bares e restaurantes aqui no Ceará e hoje ele já tem um número maior de antes da pandemia. O setor se reinventa”, afirma.
Fonte: Diário do nordeste