Apostas esportivas pagam menos imposto que bebida

Os prêmios das apostas esportivas de alíquota fixa, como as chamadas bets, terão no Brasil uma tributação inferior à aplicada a cigarros e bebidas alcoólicas e também a loterias como a Mega-Sena.

Na comparação internacional, no entanto, a carga sobre o apostador está próxima da média de outros países. Já a tributação do faturamento das empresas que oferecem esse serviço tende a ser maior do que a de outros setores no Brasil.

Especialistas na área destacam que governo e Congresso Nacional escolheram um modelo para as apostas que privilegia a regulação estatal sobre essas movimentação financeira e a arrecadação. Não houve preocupação em desincentivar essa atividade.

Em relação a fumos e bebidas, por outro lado, aplica-se claramente uma tributação adicional em relação a outros bens, facilmente repassada ao consumidor, com objetivo declarado de desestimular esse consumo – embora haja também ganho de arrecadação relevante.

lei sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no fim de 2023 que regulamenta as apostas de alíquota fixa prevê uma alíquota de 12% sobre a arrecadação das casas de apostas descontado o pagamento dos prêmios. Os apostadores devem pagar 15% de Imposto de Renda sobre o valor obtido com a premiação.

Inicialmente o governo propôs alíquotas de 18% e 30% – essa última, igual ao IR sobre o prêmio da Mega-Sena -, mas os parlamentares reduziram os percentuais.

Essas empresas também estão sujeitas à tributação do lucro com Imposto de Renda Pessoa Jurídica/Contribuição sobre o Lucro Líquido (IRPJ/CSLL) e do faturamento com Programa de Integração Social/Contribuição sobre o Financiamento da Seguridade Social (PIS/Cofins). Os municípios podem cobrar Imposto sobre Serviços (ISS). Nesses casos, uma carga em linha com outras empresas de serviços.

As casas de apostas vão pagar ainda taxa anual de fiscalização de até R$ 1,94 milhão e outorga de R$ 30 milhões para operar por até cinco anos.

Nos cigarros e bebidas, a tributação é estimada em cerca de 80%, segundo dados do Impostômetro. Os valores elevados se devem principalmente ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI)), que será substituído nesses casos pelo IS (Imposto Seletivo) para bens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, quando a reforma tributária entrar em vigor.

“O enfoque é claramente distinto. Enquanto o governo usa, ou tenta usar, o IPI como inibidor do consumo de determinados produtos, a ideia da tributação das bets, tanto nelas (empresas) como nos apostadores, é justamente aproveitar o crescimento desse mercado”, afirma Fabio Lunardini, tributarista do Peixoto & Cury Advogados.

Viés arrecadatório

Victor Schmidt, sócio da área tributária do Costa Tavares Paes Advogados, também avalia que a tributação das apostas esportivas teve viés essencialmente arrecadatório e que não houve intenção de inibir a atividade.

Ele afirma que, ao adotar alíquota de 15% de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) sobre os ganhos, o Brasil está em uma posição intermediária em relação a, por exemplo, Estados Unidos (24% apenas de imposto federal sobre o prêmio), Alemanha (5% sobre cada aposta) e Reino Unido (isenção para pessoas físicas).

O tributarista destaca, no entanto, a diferença em relação ao que ocorre no próprio Brasil, por exemplo, no prêmio da Mega-Sena.”O primeiro viés foi de fazer a equiparação com a loteria, mas ao longo dos debates houve esse consenso parlamentar para aprovação dessa redução. É um ponto que talvez alguns setores da sociedade possam questionar, porque você passa a ter a metade da alíquota que você tem para outros prêmios de loterias”, argumenta.

Serviço pode ser enquadrado no IS em 2027

Maria Andréia dos Santos, sócia da área tributária do Machado Associados, avalia que não se pode descartar a hipótese de que as apostas esportivas sejam enquadradas no Imposto Seletivo (IS) a partir de 2027, pelo potencial dano à saúde nos casos de vício.

“A emenda constitucional aprovada (da reforma) autoriza a instituição do IS sobre todos os bens e serviços que sejam prejudiciais à saúde e, inegavelmente, as apostas esportivas eletrônicas detêm potencial de causar danos à saúde humana”, afirma a advogada.

Em relação à tributação das empresas, a tributarista afirma que existem dois conceitos mundialmente adotados nessa atividade. Um é o GGR (Gross Gaming Revenue), que corresponde ao valor total das apostas arrecadadas dos jogadores, excluído o valor dos prêmios pagos.

Esse é o sistema aprovado para o Brasil e também utilizado no Reino Unido, Espanha, Dinamarca e Bélgica, por exemplo. Nesses casos, a alíquota varia de 5% a 25%. Aqui, será de 12%.

Nos Estados Unidos, a atividade é regulada em mais de 30 estados, nos quais predomina o modelo GGR.

No estado de Nova York, a alíquota é de 51%. Outros locais, como a França, aplicam a tributação sobre o valor total das apostas, com uma alíquota mais baixa.

Vinicius Pimenta Seixas, do escritório Pinheiro Neto Advogados, afirma que em outros países o GGR não se soma a tantos outros tributos, o que torna a carga no Brasil elevada.

“É natural que exista a tributação sobre a diferença entre o que é apostado e o que é pago para o apostador. Isso é um conceito mundial”, afirma o advogado.

“O que é diferente é ter um tributo específico para isso somado à tributação corporativa que já existe nas empresas. Pode-se dizer que no Brasil você tem uma carga mais elevada comparativamente aos outros países”, ressalta.

Seixas afirma que, ainda assim, as empresas terão interesse em funcionar dentro da legalidade no País, em vez de operar totalmente do exterior, para não sofrerem nenhum tipo de restrição na operação.

“Se eu sou uma empresa dentro dos limites legais que a legislação permite, consigo ter presença para fazer patrocínio para clubes de futebol, propaganda com famosos. Portanto, tenho a possibilidade de alcançar muito mais mercado e ganhar muito mais escala no Brasil”, observa o especialista.



Fonte: Diário do Comércio 

Data: 17/01/2024