Após corte do ICMS, pacote de medidas pode devolver R$ 8 bi aos cofres do Ceará, diz estudo

Para reverter as perdas devido ao corte da alíquota do ICMSpesquisadores do Observatório de Finanças Públicas do Ceará (Ofice) elaboraram um pacote de medidas que prevê aumento médio na arrecadação estadual de, pelo menos, R$ 8,3 bilhões por ano, sem aumentar a carga tributária.

O estudo foi publicado na Revista Panorama Fiscal de nº 52. Dentre as quatro ações listadas, estão a criação de um fundo de compensação e a atualização das margens de lucro fiscal e contábil das empresas, com incremento anual previsto de R$ 6,5 bilhões e R$ 1,8 bilhão, respectivamente. 

O tempo de execução dos processos levaria de três meses a um ano. Segundo o Ofice, o levantamento já foi entregue à Secretaria da Fazenda do Estado (Sefaz).

A pasta, todavia, preferiu não comentar sobre os dados. 

CONHEÇA OS QUATRO PONTOS APONTADOS PELO OFICE PARA EVITAR ESSES PREJUÍZOS:

CRIAÇÃO DE UM FUNDO DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL (FPS)

  • O que prevê: a alteração do Pacto Federativo (regras constitucionais que determinam as obrigações financeiras), por meio de uma Emenda à Constituição Federal, para viabilizar a criação do FPS. O fundo englobaria receitas de transferências provenientes das Contribuições Sociais arrecadadas pela União, como Cofins, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e Receitas de Loterias, nos mesmos percentuais e cálculos dos fundos de participação dos estados (FPE) e dos Municípios (FPM), de 21,5% e 22,5%, respectivamente;
  • O que mudaria: atualmente, a União detém a arrecadação de 100% das receitas dessas contribuições. Com o novo fundo, esses recursos também seriam repassados aos demais entes federativos, fazendo parte do Orçamento da Seguridade Social dos estados e dos municípios, para serem aplicados em saúde, previdência e assistência social;  
  • Impacto: o efeito da criação do FPS seria nacional. No Ceará, a estimativa de incremento na arrecadação é de, em média, R$ 6,5 bilhões por ano;
  • Tempo para execução: previsão de um ano;
  • Desafio: articulação política no Congresso para criação do FPS via alteração do pacto federativo.  
    Os resultados do estudo demonstram que o Ceará teria R$ 69,02 bilhões acumulados, entre 2009 e 2019, com a criação do FPS. 

REVISÃO DAS MARGENS DE LUCRO POR COBRANÇA DO ICMS POR CARGA LÍQUIDA, CONFORME LEGISLAÇÃO

  • O que prevê: a revisão anual das alíquotas do ICMS cobrado por carga líquida, para confrontar e equalizar a margem de lucro fiscal (estabelecida pela legislação tributária) com a margem de lucro contábil (estabelecida pelas empresas com base no mercado) dos bens e serviços com incidência do ICMS;
  • O que mudaria: alteração da legislação tributária do ICMS para adequar a margem de lucro fiscal à contábil, mudança que ocorreria via decreto, conforme previsto na Lei 14.237/2008;
  • Impacto: Incremento na arrecadação do ICMS de, em média, R$ 1,8 bilhão por ano; 
  • Tempo para execução: previsão de três meses;
  • Desafio: pressão dos setores econômicos, considerando que, embora não ocorra o aumento da carga tributária, o ajuste da alíquota pode ser para mais ou para menos.
    Conforme os cálculos dos pesquisadores, o Ceará deixou de arrecadar, em 2016, 2017 e 2018, R$ 1,6 bilhão, R$ 1,4 bilhão e R$ 2,4 bilhões, respectivamente, por não praticar a medida.

APRIMORAMENTO DA FISCALIZAÇÃO DOS TRIBUTOS ESTADUAIS BASEADO NA EFICÁCIA E NA EFICIÊNCIA

  • O que prevê: fiscalização com base nos setores da economia: primário, secundário e terciário;
  • O que mudaria: intensificação das atividades fiscalizatórias para o cruzamento de informações fiscais e contábeis;
  • Impacto: a medida ocasionaria a inibição da sonegação fiscal e traria resultados positivos aos cofres públicos, a depender do quanto o Estado deixa de arrecadar devido às sonegações das empresas;
  • Tempo para execução: previsão de um ano. 

NOVO CONCURSO PÚBLICO PARA A SEFAZ

  • O que prevê: reposição do quadro de servidores para suprir o número de aposentadorias nos últimos anos, com vagas para todas as áreas: tributação, arrecadação, fiscalização e finanças;
  • Impactos: melhoraria da eficiência e da eficácia da administração fazendária e, consequentemente, aumento da arrecadação por meio do combate à evasão fiscal. 
  • Tempo de execução: a depender da articulação.   

REVERTER A SITUAÇÃO É CRUCIAL PARA A JUSTIÇA SOCIAL; ENTENDA O PROBLEMA

Com a redução do percentual do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) que incide sobre os combustíveis e serviços essenciais, o Ceará deverá perder mais de R$ 2,23 bilhões que seriam investidos em educação, saúde e assistência social, em 2022, conforme o Observatório de Finanças Públicas do Ceará (Ofice). 

Os valores estimados, que consideram a inflação de 2022, são somente uma média, podendo variar para mais ou para menos.

Planejar como enfrentar esse duro golpe aos cofres do Estado e dos municípios cearenses é fundamental para o desenvolvimento econômico e social nos próximos anos, afinal, os tributos são revertidos em financiamentos públicos para atender à população, sobretudo, a mais vulnerável. 

A competência da arrecadação do ICMS é estadual. No Ceará, 75% dos valores recolhidos ficam com a própria unidade federativa para investimentos em áreas prioritárias. O restante (25%) deve ser repassado aos municípios, a ser distribuído conforme indicadores populacionais e sociais. 

Feita a partilha, as cidades devem destinar a quantia recebida para despesas obrigatórias com educação (25%) e saúde (15%), enquanto o remanescente pode ser aplicado nas demais despesas, incluindo os investimentos.

Em junho deste ano, contudo, houve o corte desse tributo — que ocorreu por força da Lei Complementar 194/22. No Ceará, por exemplo, o tarifa do ICMS sobre a gasolina despencou de 27% para 18%, minguando a arrecadação local. Para se ter ideia, segundo a Sefaz, até agosto último, a queda da receita tributária foi de 14%.  

A mudança da alíquota foi articulada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), com o objetivo de reduzir o custo dos combustíveis antes das eleições. Naquele período, a Petrobras praticou diversas correções, consequentemente, a inflação disparou. 

Para estancar os aumentos, os impostos federais também foram alterados, mas com uma diferença: as alíquotas foram reduzidas apenas até o fim do ano. Já os percentuais dos estados serão menores de forma definitiva.

O alívio do peso tributário, contudo, não foi o suficiente, e a estatal precisou frear os reajustes em meio à pressão política. Com essas duas contenções, a classe média conseguiu observar o preço da gasolina cair nas bombas.

Do outro lado, os mais pobres poderão sentir os impactos negativos desse movimento com a precarização dos serviços públicos devido à escassez de recursos. 

Nessa corda bamba, os estados precisam encontrar saídas para reverter o cenário. Para o pesquisador do Ofice, Lúcio Maia, há uma necessidade urgente de aplacar o problema.

“Os tributos arrecadados pelos estados (ICMS, ITCD e IPVA), 80% se referem ao ICMS. Então, é uma perda muito grande que influenciará na educação, na saúde, outros gastos”, calcula. 

“Era para ter sido feita uma contrapartida que compensasse, como ocorreu com  a Lei Kandir”, exemplifica a legislação que isenta o ICMS sobre as exportações, mas prevê a criação de um fundo para recuperar os danos. 

Contudo, algumas compensações foram vetadas da norma. Dentre elas, a que pedia pela preservação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).


Fonte: Diário do Nordeste


Data: 07/11/2022